6.1.09

Oriente Médio: o caminho da paz não passa pelo maniqueísmo, por Bernardo Sorj*

[ este artigo foi postado em 4 de janeiro no site do prof. Simon Schwartzman, ex-presidente do IBGE]

Compreender sem simplificar

O conflito no Oriente Médio é complexo. Aqueles que procuram transformá-lo num filme de Hollywood no qual o mocinho e o bandido são claramente identificáveis e em que um lado representa o bem e o outro lado o mal estão fazendo um desserviço à verdade e à causa da paz.

Como em geral acontece com os dramas históricos, o conflito no Oriente Médio é a conseqüência não-intencional de projetos humanos em que cada ator social procura realizar seus próprios objetivos, que terminam colidindo com os de outro ator. Tendo como base o drama de dois povos reivindicando a mesma terra, as lideranças políticas de ambos os lados acumularam erros que alimentaram a desconfiança e o extremismo no interior de cada povo, dificultando ainda mais o caminho da paz.

Que erros foram esses? Sem entrar em detalhes históricos que fugiriam aos limites deste curto artigo, podemos indicar, nas últimas décadas, do lado dos governos israelenses, a ocupação militar e a expansão constante das colônias na Cisjordânia e, do lado das lideranças palestinas, a conivência com o terrorismo e a ambigüidade em relação à plena aceitação da existência do Estado de Israel.

Criticar sem ofender nem mentir

O caminho da paz exige a comunicação e o reconhecimento da humanidade de todos. Quem quer a guerra vê o demônio no outro. Desumanizar o adversário, em algum momento, justifica a sua destruição. Durante cinco anos morei em Israel e lutei com meus colegas árabes pela paz e contra a política israelense de colonizar os territórios conquistados na guerra de 1967. Na época, enfrentei com meus colegas os políticos israelenses que procuravam assemelhar Arafat a Hitler e o movimento palestino, ao nazismo. Hoje sofro quando vejo grupos pró-palestinos fazerem o mesmo em relação ao sionismo.

Dizer que o sionismo equivale ao nazismo é uma mentira deslavada, uma agressão moral. E, como tal, produz do lado israelense e judeu uma reação defensiva que alimenta o sentimento de incompreensão e a incomunicação. Sejamos claros: Hitler exterminou sistematicamente todos os judeus que se encontravam nos territórios ocupados pela Alemanha nazista. Acontece que, no Estado de Israel, em l949, viviam 120.000 árabes. Hoje, eles são mais de um milhão. Calcula-se em torno de 500.000 os refugiados árabes da guerra de 1948. Eles e seus descendentes somam de 4 a 5 milhões. Não houve, em nenhum sentido possível do conceito, um genocídio. Não se trata de negar o sofrimento pelo qual passou e passa o povo palestino. Mas não desvalorizemos os fatos históricos, respeitando os sentimentos daqueles que passaram pela experiência do holocausto. E lembremos, sobretudo, que as palavras não são ingênuas. Quem fala de genocídio transforma o outro em genocida, o que permite que seja tratado como tal.

Direitos humanos ou instrumentalização política?

Entendo a simpatia e solidariedade com a causa palestina, seja do mundo árabe, de descendentes de árabes e muçulmanos e de pessoas de boa vontade identificada com o sofrimento palestino. Este sentimento é compreensível, assim como é a preocupação de judeus e não-judeus com a segurança de Israel. Mas em nenhum dos dois casos é aceitável o apoio acrítico a lideranças radicais, seja israelenses que não se dispõem á devolver os territórios conquistados, seja palestinas que sustentam um programa político que propõe a destruição do Estado de Israel.

Preocupa-me e dói a manipulação política do conflito por intelectuais e organizações que, no Brasil e no exterior, assumem uma posição antiisraelense primária, em geral ignorante da história da região que, por momentos, beira ao anti-semitismo e cuja única motivação é uma ideologia política que associa Israel aos Estados Unidos. Para tais grupos, os Estados Unidos são o grande inimigo. Ergo, quem está associado com o diabo, diabo é. Preocupa e dói porque esses indivíduos e grupos manipulam a bandeira dos direitos humanos, porém não têm nenhum compromisso real com o sofrimento humano. Porque, se tal sentimento existisse, estariam também fazendo panfletos e circulando com as bandeiras do povo checheno, curdo, sudanês ou tibetano, que custaram e continuam cobrar a vida de milhões de pessoas.

Mas a agenda destes grupos não é a dos direitos humanos nem a da paz do Oriente Médio. É uma agenda política que quer ver o circo pegar fogo para confirmar os preconceitos ideológicos. É, portanto, uma agenda perigosa, irresponsável e desumana.

O povo palestino e o mundo árabe, Israel e o povo judeu não são homogêneos
No ardor da luta contra o ataque militar israelense, parte da mídia e de grupos pró-palestinos e pró-Israel transmite a imagem de que a causa palestina e o mundo árabe e muçulmano, assim como Israel e o povo judeu, constituem uma unidade. Transformam um conflito político nacional no qual estão em jogo interesses e estratégias terrenas em um conflito religioso. Nada mais longe da realidade. O mundo árabe está – e sempre esteve – dividido.

Para cada governo árabe, a causa palestina ocupa um lugar específico no seu projeto político interno e externo. Afinal, não podemos esquecer que o território reivindicado pelo povo palestino para a criação de seu Estado nacional esteve, entre 1948 e 1967, nas mãos da Jordânia e do Egito, não de Israel. No lado israelense, a divisão política interna sempre foi explícita e, embora as relações entre boa parte da diáspora judaica e Israel sejam de solidariedade, isso não significa nenhum alinhamento ou co-responsabilidade com os governos eleitos pelos cidadãos de Israel (inclusive pelos 20% de árabes israelenses).

Lembrar que não vivemos em mundos culturais formados por blocos coesos é fundamental. O fanatismo e o extremismo de cada lado se alimentam mutuamente. Falemos claro: nem o extremismo palestino nem o israelense têm interesse em negociações políticas, pois nenhum deles está disposto a abrir mão de seus sonhos maximalistas. O caso do assassinato de Rabin é exemplar: morto por um extremista israelense, sua obra de pacificação não pôde ser completada por Shimon Peres, pois, apesar de sua enorme vantagem inicial na campanha eleitoral, a onda de atentados terroristas palestinos levou ao poder um primeiro- ministro da extrema direita.

O que será?
Nenhum povo tem o monopólio da moral nem está ao abrigo de entrar num ciclo de destruição. Quem quiser procurar na história fatos favoráveis à versão de cada lado os encontrará em quantidades monumentais. O caminho da paz exige um doloroso esforço de abandono dos mitos e ilusões que cada parte elaborou sobre si mesmo e o outro. O passado não pode ser esquecido, todavia será em torno de uma visão do futuro que um novo presente poderá ser construído.

Penso que nós, que não participamos diretamente da vida política dos países da região devemos lutar pelo essencial: apoiar a abertura de todos os canais de comunicação, de toda iniciativa de paz. Nós, que temos a sorte de viver no Brasil, um país que, apesar dos imensos problemas sociais, é um exemplo para o mundo de convivência prazerosa entre as diversas religiões, devemos nos esforçar por alimentar o diálogo, a esperança e a abertura de espírito, não permitindo que a intolerância e o ódio nos contaminem.
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Bernardo Sorj é professor titular de Sociologia da UFRJ e Diretor do Centro Edelstein de Pesquisas Sociais

4.1.09

De guerra, cessar-fogo e divergências


[Artistas e Guerra, Saul Steinberg, 1969]

A decisão israelense de enviar tropas terrestres, tanques e artilharia a Gaza, depois de oito dias de ofensiva aérea, tem levantado uma questão, entre outras, sobre o futuro próximo: a invasão vai destruir a infra-estrutura do Hamas e pôr fim aos ataques por foguetes a Israel? As previsões variam.

Perguntas instigantes, que não recorrem a adjetivos bombásticos, ajudam a refletir. Como as que foram feitas no artigo dominical do diretor da sucursal do The New York Times em Jerusalém, Ethan Samuel Bronner: é possível interromper a chuva de foguetes enquanto o Hamas mantiver o poder político em Gaza? Se o governo israelense acha que não é possível, então o verdadeiro objetivo da operação militar é destruir completamente o grupo, qualquer que seja o custo em vidas? Por outro lado, como tirar do poder um grupo que tem hoje de 15 mil a 20 mil homens armados?

Mesmo que a queda do Hamas venha a acontecer, depois de semanas ou meses de guerra, com baixas impactantes, ainda haverá perguntas incômodas, diz o jornalista do NYT. “Quem assumirá o controle [de Gaza] quando tudo isso terminar?” é uma delas.

O acirramento da disputa entre Fatah e Hamas é um dos desdobramentos da ofensiva. Outro desdobramento, segundo Khalil Shikaki, diretor do Palestinian Center for Policy and Survey Research, ouvido pelo jornal Washington Post, é o risco de que a situação se deteriore rapidamente na Cisjordânia, com a frustração e a ira voltando-se contra a Autoridade Palestina.

Também há divergências entre os que apóiam Israel, ainda que a necessidade de defesa seja uma unanimidade e ninguém engula a história, divulgada pela mídia européia, de que o Hamas usa foguetes "artesanais". Por exemplo, o Meretz, partido de esquerda israelense, defendeu a ofensiva no primeiro momento, ainda que depois tenha proclamado a urgência de um cessar-fogo, devido ao risco de Israel afundar-se no "pântano lamacento de Gaza".

Segundo notícia publicada no jornal Maariv, uma candidata árabe-palestina do Meretz desistiu de concorrer às próximas eleições devido ao apoio do partido aos ataques contra o Hamas em Gaza. Um membro do partido, Abu Vilan, afirmou: "O Meretz não é pacifista. Quando cidadãos do Estado de Israel são atingidos pelo terror, deve se dar uma resposta com toda força.... O Meretz entende que Israel deve defender seus cidadãos, sejam judeus ou árabes."

Essa informação está no excelente blog em português http://urishalaim.blogspot.com/ , de Uri Lam (desde Jerusalém). Uri é psicólogo, tradutor de livros judaicos, co-editor da coleção judaica “Povo do Livro”, em parceria com a Ed. Via Lettera. Outro blog em português, diretamente de Beeer Sheva, o de André Hamer: http://namiradohamas.blogspot.com/. Ambos têm atualizações diárias que vale a pena ler, um outro lado para o leitor cansado de pensamentos maniqueístas que nada acrescentam à compreensão dos fatos.

Reproduzo a seguir dois artigos com posições diferentes. Primeiro, um artigo para o jornal Haaretz, de Ari Shavit, um forte opositor dos assentamentos israelenses, que explica porque considera justa a guerra atual. No post seguinte, está o comunicado do grupo judaico norte-americano J Street, um dos primeiros a proclamar a necessidade de uma ofensiva diplomática que impeça a continuação dos ataques palestinos mas também evite a escalada bélica, sob o argumento de que isso é que vai garantir a segurança de Israel a longo prazo.

2.1.09

A justificativa de Shavit para a "guerra justa"

Diz Ari Shavit sobre a ofensiva:

[...] Justa, porque no verão de 2005 Israel destruiu todos os assentamentos judaicos na Faixa de Gaza e retirou-se unilateralmente para a fronteira internacional. Justa porque de 2006 a 2008 a autoridade palestina na Faixa não aproveitou o fim da ocupação para construir-se e construir seu futuro e, em vez disso, repetidamente atacou Israel dentro da Linha Verde.

Justa, porque por três anos consecutivos o Estado de Israel se conteve e agiu de maneira comedida. Justa, porque nenhum país no mundo pode aceitar por um longo período uma situação em que seus cidadãos são ameaçados e sua soberania violada. Justa, porque não há chance de paz no Oriente Médio se o Estado judeu for visto como uma presa fácil sangrando na água e atraindo os tubarões.

A operação é uma campanha trágica. Trágica, porque está causando a morte de centenas e ferindo milhares. Trágica, porque está causando danos físicos e emocionais a palestinos inocentes, inclusive mulheres e crianças. Trágica, porque como toda guerra, esta cria vicissitudes humanas intoleráveis e sofrimento pungente.

Mas a tragédia advém diretamente do fato de que os palestinos não aproveitaram adequadamente a oportunidade histórica que lhes foi concedida em 2005. Advém do fato de que os palestinos usaram mal o auto-governo quando o obtiveram, pela primeira vez na sua História. E advém do fato de que a necessidade palestina de destruir Israel é ainda mais forte do que sua necessidade de construir a Palestina.

Os israelenses que odeiam Israel chamam a operação de crime de guerra. Registram os nomes da cada palestino morto, denunciam cada ação israelense e retratam seu Estado como opressor. Enquanto os egípcios afirmam que o Hamas é o principal responsável pela tragédia de Gaza, os israelenses que odeiam Israel jogam toda a responsabilidade em seu governo e nos militares. Enquanto a comunidade internacional compreende, em silêncio, que um Estado soberano tem a obrigação de proteger as vidas de seus cidadãos, os israelenses que odeiam Israel acreditam que vidas israelenses podem ser perdidas.

Enquanto os fatos básicos indicam que a violência no sul tem origem nas ações desprezíveis de uma organização extremista que transformou a Faixa num distrito do terror, os israelenses que odeiam Israel persistem em odiar seu povo e sua pátria e defendem a moralidade da agressão destrutiva do Hamas.

Ninguém está conclamando a que sejam odiados os israelenses que odeiam Israel. Ao fim de cada dia, a posição deles se mostra patética. Sua incapacidade de demonstrar compaixão pelos israelenses de Beersheva, Ashdod, Ashkelon e Sderot mostra que eles têm algum grau de crueldade. Sua incapacidade de ver os árabes que disparam foguetes como responsáveis pelas próprias ações mostra que não estão isentos de paternalismo.

A verdadeira motivação dos israelenses que odeiam Israel não é a preocupação genuína pelos palestinos, mas é, com efeito, uma forma reversa de racismo. Ao perdoar o fascismo palestino, eles não desprezam apenas os israelenses, mas também os palestinos moderados e que prezam a liberdade. Os que culpam Israel por tudo e absolvem os palestinos de tudo não servem a causa da paz nem ajudam a pôr fim à violência e à ocupação.

É possível que, após a campanha aérea inicial e a destruição dos túneis, a operação devesse ter sido suspensa. É possível que a trégua proposta pela França deva ser agora adotada, e uma chance final deva ser dada à lucidez palestina. Mas os que rejeitam o conjunto da operação estão cegos à realidade e ao fracasso moral.

Os próximos dias serão difíceis. Pode haver erros, talvez complicações, talvez até mesmo vítimas. Mas por essa mesma razão este não é o momento para uma campanha de ódio contra os líderes de Israel, seus comandantes, soldados e pilotos. Justamente o contrário. Este é o momento de fortalecer o Primeiro-Ministro Ehud Olmert, que está provando ser um líder nacional respeitado.

Este é o momento de apoiar os comandantes, soldados e pilotos que trabalham dia e noite para conduzir uma guerra difícil, complexa e inteiramente justa. Este é o momento de Israel finalmente agir como uma nação madura que se protege com sabedoria e contenção.

Em defesa "da razão e da moderação"

Os quatro grupos norte-americanos pró-Israel que defendem o direito de ataque às instalações do Hamas em Gaza, mas exortam o próximo governo a estabelecer negociações diplomáticas imediatas com as partes envolvidas, para evitar uma escalada militar contra-producente a longo prazo, são J Street, Americans for Peace Now, Brit Tzedek v'Shalom e Israel Policy Forum.

Esses grupos vêm se fortalecendo nos últimos anos e vão na contra-mão do que parecia, aos olhos da opinião pública, ser um senso comum judaico favorável a todas as manifestações de força militar israelense. Eles abrigam uma vasta gama de pacifistas, inclusive religiosos, liberais, gente de centro, centro-esquerda e esquerda. Como em outros países, as instituições comunitárias guarda-chuva, Jewish Council for Public Affairs e Conference of Presidents of Major American Jewish Organizations, dão apoio irrestrito à ofensiva bélica.

O porta-voz do Americans for Peace Now, Ori Nir, disse: “Não vemos a questão da operação israelense como um tema preto-e-branco e inequívoco”. O grupo enviou um comunicado aos seus mais de dez mil ativistas, exortando-os a escrever para Bush e Obama (uma tradição norte-americana) defendendo a solução política e diplomática para o conflito.

Abaixo, o comunicado inicial do J Street. Quem assina é o diretor on line do grupo, Isaac Luria, cuja esposa fez estudos rabínicos em Israel e que demonstra sua perplexidade diante da cobrança de uma posição imediata. Como se o mundo fosse tão simples!!! Luria tem o mesmo nome do famoso erudito, cabalista e místico (1534-1572) que influenciou de modo marcante a vida religiosa e os costumes litúrgicos judaicos.

Há 24 horas as Forças de Defesa de Israel atacaram a Faixa de Gaza, deixando centenas de mortos e feridos – e impelindo ainda mais o persistente conflito israelense-palestino rumo a uma rota de violência interminável.

Senti uma pressão imediata de amigos e familiares para tomar partido. Eu opinava que as ações de Israel eram plenamente justificadas ou desproporcionais? O Hamas atraiu aquilo sobre si ao lançar foguetes e provocar Israel ou os ataques são um ato de agressão contra um povo preso na armadilha da miséria e da pobreza? Eu não era capaz de ver quem tinha razão e quem estava errado?

Nesse momento de profunda crise, J Street quer demonstrar que, entre aqueles que se importam com Israel e sua segurança, há um grupo que defende a razão e a moderação. Há muitos que reconhecem elementos de verdade em ambos os lados dessa divisão e sabem que aproximá-los exige um forte engajamento e liderança dos EUA.

Israel tem um lugar especial no meu coração. Vivi lá no ano passado, enquanto minha mulher estudava para se tornar rabina. Mas reconheço que nem os israelenses nem os palestinos têm o monopólio do certo ou do errado. Se nada há de “certo” em fazer chover foguetes sobre famílias israelenses ou enviar atacantes suicidas, tampouco nada há de “certo” em punir um milhão e meio de sofredores habitantes de Gaza por causa das ações dos extremistas que vivem entre eles. O que é preciso agora é ação imediata para interromper a violência antes que ela saia do controle.

Os Estados Unidos, o Quarteto e a comunidade mundial não devem esperar – como fizeram na crise Israel-Líbano de 2006 – que as semanas passem e mais centenas ou milhares de pessoas venham a morrer antes de intervirem. É preciso que seja dado um fim urgente às novas hostilidades, encerrando completamente as operações militares, inclusive o lançamento de foguetes a partir de Gaza, o que permitirá que entrem em Gaza alimentos, combustível e outros bens necessários á vida civil.

A necessidade de comprometimento diplomático vai além de um cessar-fogo a curto prazo. Oito anos da negligência e da diplomacia ineficaz do governo Bush levaram-nos diretamente a um momento em que as perspectivas de uma solução de dois Estados para o conflito israelense-palestino estão em compasso de espera e com elas as perspectivas de sobrevivência de Israel a logo prazo como um Estado judeu democrático.

Em seguida a um cessar-fogo renegociado, exortamos o próximo governo Obama a liderar um rápido e sério esforço para alcançar uma solução diplomática abrangente para os conflitos israelense-palestino e árabe-israelense.

[...] Nossos objetivos devem ser um Oriente Médio que se mova para além dos conflitos sangrentos, um Israel seguro e aceito na região, e uma América segura graças à redução do extremismo e do fortalecimento da estabilidade. Nenhum desses objetivos se alcança com a escalada [do conflito].

Até mesmo no calor da batalha, como amigos e apoiadores de Israel, precisamos lembrar que só a diplomacia e as negociações podem pôr fim aos foguetes e ao terror e trazer a Israel segurança e paz a longo prazo. Os políticos norte-americanos já estão ouvindo as vozes daqueles que só enxergam um lado. Ajude-nos a dar voz ao grande número de norte-americanos que entendem que a justiça só será feita quando os direitos e as reivindicações de ambos os lados forem reconhecidos e for elaborada uma solução pacífica de dois Estados para esse conflito que já transcorre há um tempo longo demais.

Sabemos que muitos formuladores de políticas concordam conosco privadamente, porém hesitam em expressar seus pontos de vista em público, por ouvirem apenas o que dizem os extremistas. Esse é nosso momento de mostrar que há um apoio político real para afastar do Oriente Médio uma abordagem estreita, do tipo “nós contra eles”. A situação em Gaza não poderia ser mais urgente. Quem sabe quantas vidas mais serão perdidas antes que termine esse round de violência? Quando terminar, olharemos para trás e diremos que se tivéssemos falado antes mais vidas poderiam ter sido salvas, mais danos poderiam ter sido evitados?

Tanto quanto consigo lembrar, aqueles que enxergam o mundo em preto e branco têm prevalecido sobre aqueles que vemos as nuances do cinza. Espero que você nos ajude a mudar essa dinâmica, enviando a todos os seus conhecidos essa mensagem, depois de ter assinado nossa petição.

Muito obrigado por unir-se aos nossos esforços nesse momento difícil. Juntos, podemos conseguir o fim desse round de violência, retomar o cessar-fogo e levar a cabo um sério movimento em direção à paz entre Israel e o povo palestino.

- Isaac Luria
Diretor Online
J Street
28 de dezembro, 2008

Responsabilidade partilhada

Numa sociedade livre, alguns são culpados, mas todos são responsáveis

A frase é do rabino Abraham Joshua Heschel (1907– 1972), filósofo, erudito, poeta e ativista social nos Estados Unidos. Ele participou da marcha pelos direitos civis em Selma, ao lado de Martin Luther King, de quem foi amigo. Heschel foi um raro caso de personalidade carismática capaz de conciliar reflexão, ação, ética, profundidade espiritual e luta em prol de justiça para todos (www.heschel.org.il). Não se considerava um "eleito", mas alguém que estava na Terra para servir ao próximo.

Estereótipos são didáticos







O cenário cultural de Chicago, a cidade de Barack Obama, nunca é frio como a cidade. Um exemplo é o Museu Judaico, ou Spertus Museum (homenagem aos irmãos Maurice e Herman Spertus), que aposta em desafiar o óbvio. Em 2008, uma exposição de mapas antigos e contemporâneos da Palestina acabou fechada por pressão de alguns financiadores da instituição, que não gostaram da aparente defesa de direitos palestinos a terras hoje ocupadas por colonos israelenses. Agora, está em cartaz (até 18 de janeiro) a mostra “Twisted Into Recognition: Clichés of Jews and Others”, que já passou pelo Museu Judaico de Berlim e o Museu Judaico de Viena.

Uma das obras que chocaram alguns foi essa Barbie acima, de Jen Taylor Friedman, usando talis and tefilin (Tefillin Barbie). Outra foi a instalação de Tamir Lahav-Radlmesser com amostras de pelos púbicos. A autora quis fazer um contraponto a uma exposição de 1939 em que o departamento de antropologia do Museu de História Natural de Viena exibiu pêlos púbicos retirados de 500 judeus.

Der Giftpilz: ein Stürmerbuch für Jung und Alt ("O Cogumelo venenoso: um livro da SS para Jovens e Velhos”) é a ilustração da edição de 1938 de um livro didático alemão. Os meninos observam o colega que mostra o número 6, assim explicado pela legenda: “Die Judennase ist an ihrer Spitze gebogen. Sie sieht aus wie ein Sechser,” ou, “O nariz judaico é curvado no alto. Parece um seis”. A bengala, vienense, de cerca de 1900, fala por si só...

O prédio do Spertus Museum tem, além das galerias, teatro com 400 lugares, biblioteca, salas de aula, um centro infantil interativo e um centro didático para professores e pais. A exposição atual atrai um público diversificado, que habitualmente não freqüenta galerias de arte. Aliás, a missão didática (biscoito fino para as massas) é, segundo a curadoria, uma das justificativas de um museu contemporâneo. Quem percorre a mostra entende logo, mesmo que pouco conheça de História, o absurdo e a brutalidade dos estereótipos, reforçados por meio de imagens e objetos, e que levam, no limite, à aceitação da perseguição e da eliminação física daqueles que parecem diferentes.