29.3.09

Liga anti-difamação critica charge


Esta charge de Pat Oliphant, publicada no mundo todo, está sendo acusada de antissemita pela Liga Anti-Difamação, por causa do "uso ofensivo da estrela de Davi em combinação com imagens que remetem ao nazismo".

"A operação defensiva militar de Israel para proteger as vidas de seus homens, mulheres e crianças que estão sendo continuamente bombardeados por ataques de foguetes do Hamas foi deturpada para mostrar as vítimas como agressores sem coração e sem cabeça", diz a Liga.

Alguns discordam do argumento. Por exemplo, o comentarista e editor Ezra Klein, do liberal American Prospect, acha que dizer que a um governo faltam cabeça e coração não é uma declaração sobre um traço intrinsecamente judaico. A crítica pode até ser extremada e ofensiva a Israel, mas será mesmo antissemita? - duvida ele. "E, de fato, não é positivo ficar forçando os críticos de Israel a decidirem se também são antissemitas. Em alguns casos, você intimidará o crítico a silenciar. Em outros, normalizará o antissemitismo", argumenta.

Outro que discorda que a charge seja especificamente antissemita é Barry Rubin, intelectual conservador, diretor do Global Research in International Affairs Center e editor da Middle East Review of International Affairs Journal. Mas, ainda que sem defender qualquer censura, ele alerta para o caráter extremamente pernicioso do tipo de pensamento que a charge reflete. "O que existe aqui é uma falta de compreensão tão enorme, do tipo que incita o ódio, causa violência e morte e bloqueia políticas necessárias para ajudar as pessoas, inclusive os palestinos, que são supostamente o objeto de solidariedade da charge", diz. Veja todo o argumento de Rubin em http://israelinsider.ning.com/forum/topics/barry-rubin-the-loathsome.

Considerado pelo jornal New York Times "o cartunista mais influente em atividade” nos dias de hoje, na área de cartuns "editoriais', Pat Oliphant é um ícone entre os profissionais da área. Australiano radicado há quatro décadas nos EUA, é também um super-premiado gravurista e escultor. Ele volta e meia gera protestos: ano passado, incorreu na ira dos cristãos pentescotais ao publicar uma caricatura nada gentil de Sarah Palin, candidata a vice-presidente dos EUA.

26.3.09

Museu dedicado a Scholem Aleichem em Kiev


Na mesma casa de Kiev onde Scholem Aleichem (1859-1916) escreveu “Tevie, o Leiteiro”, a inauguração de um museu pelas autoridades locais foi, mês passado, um dos marcos das celebrações dos 150 anos do escritor. Manuscritos originais em idish, fotos, pertences pessoais e cartazes de apresentações das peças de Scholem Aleichem no mundo ficarão em exibição permanente.

O escritor nasceu em 2 de março de 1859 em Pereyaslav, nos arredores de Kiev. Órfão de mãe aos 12 anos, usou o linguajar rude da madrasta como inspiração para seus primeiros escritos. Mais tarde, aproveitou os moradores judeus da vizinha Voronkov, onde foi criado, como modelos para seus personagens.

Já existe, desde 1997, um monumento a Sholem Aleichem (uma estátua de bronze) em Kiev. Agora, o Banco Nacional da Ucrânia lançou uma moeda de prata e o país um selo comemorativo. Nem em seus maiores arroubos de imaginação o escritor sonharia que algum dia receberia tais homenagens em solo ucraniano, onde os judeus foram vítimas de pogroms, pobreza e, durante a Segunda Guerra, assassinatos em massa.

“A figura de Sholem Aleichem e sua contribuição literária ao tesouro da vívida cultura multiétnica da Ucrânia merecem respeito e celebração nos mais altos níveis”, proclamou Ivan Vasiunyk, vice-primeiro-ministro do país e presidente do comitê que organizou as homenagens em Kiev.

Scholem Aleichem viveu na Suíça, Itália e Alemanha antes de emigrar em 1914 para os Estados Unidos, onde virou celebridade – seus funerais em Nova York, em 13 de maio de 1916, foram acompanhados por mais de cem mil pessoas. Ficou famoso fora do mundo judaico, na segunda metade do século XX, depois que suas histórias se tornaram a base para o musical “O Violinista no Telhado”, sucesso na Broadway e em Hollywood.

Antes de Scholem Aleichem, a ficção em idish tendia ao sentimentalismo, estilo novelão com muitas lágrimas e final feliz. Com ele e seus personagens, os leitores mergulharam nas agruras do cotidiano dos judeus na Rússia e se reconheceram em temas universais, como o conflito entre a tradição e o progresso, ou entre ricos e pobres, tratados de maneira ao mesmo tempo bem humorada e profunda.

Livro argentino sobre Holocausto selecionado para Feira de Frankfurt


Los niños escondidos. Del Holocausto a Buenos Aires”, de Diana Wang (Editorial Marea), foi um dos quatro livros argentinos escolhidos para representar seu país na Feira do Livro de Frankfurt de 2010 (os outros autores são Alan Pauls, Liliana Bodoc e Fabián Casas).
O livro é a história do Holocausto vista pelo olhar de crianças que sobreviveram às suas famílias porque tiveram a sorte de ser escondidas durante a Segunda Guerra (fisicamente ou em suas identidades).

A obra está pensada como um guia didático: tem mapas, referências históricas, sociais, econômicas e políticas. Mas também tem muita emoção. Pois os 30 sobreviventes que deram seus depoimentos não tiveram uma vida fácil, ainda que no final quase todos tenham conseguido se estabilizar na Argentina.

Segundo Diana, é difícil calcular o número de judeus que entraram no país entre 1945 e 1950, pois muitos o fizeram de forma ilegal. Alguns optaram por ocultar sua identidade durante décadas, só a revelando a filhos ou netos recentemente, após a redemocratização do país. É que um fator adicional de sofrimento marcou os judeus argentinos, lembra a escritora: “o enorme poder da Igreja católica local, o terror e a repressão sofridos [pelos judeus] durante as ditaduras militares, especialmente a última, e os dois grandes atentados, à Embaixada de Israel em 1992 e à AMIA em 1994”.

A autora nasceu na Polônia em 1945 e chegou à Argentina em 1947. Psicóloga e escritora, é membro do comitê de assessores da International Federation of Jewish Child Survivors of the Holocaust e preside o Generaciones de la Shoá en Argentina.

Amor e judaísmo na França medieval


Salomão Ben Isaac, conhecido como Rashi, foi um dos maiores sábios judeus de todos os tempos. São dele os primeiros comentários do Talmud. Mas pouco se sabe sobre sua vida e menos ainda sobre suas filhas Joheved, Miriam e Raquel, que chegaram a estudar as leis judaicas em pleno século XI, época em que o conhecimento era interditado às mulheres. Foram necessários cinco anos de pesquisa para a norte-americana Maggie Anton dar forma à trilogia As filhas de Rashi, cujo primeiro volume, Joheved, chegou às livrarias brasileiras pela Editora Rocco. É um romance histórico com todos os ingredientes do gênero -- ou seja, seu compromisso é entreter o leitor com uma história ágil e diálogos verossímeis, mas frutos da imaginação, tudo sobre um pano de fundo de acontecimentos reais.

Rashi & família viveram em Troyes, noroeste da França, numa época em que a comunidade judaica da França vivia num clima de respeito aos seus direitos similar àquele que os judeus da Espanha desfrutaram antes da Inquisição. Para recriar o cenário da época, Anton fez um extenso trabalho de pesquisa, minuciosamente detalhado no livro. Entremeados à trajetória de Joheved, fatos sobre medicina, rituais, relações maritais, crenças e costumes dos judeus na Idade Média compõem um painel dos mais interessantes.

Água!

Crianças israelenses brincam junto a medidores de nível da água no Mar da Galiléia

por Ronaldo Wrobel [ advogado e escritor; o artigo foi publicado originalmente na revista Menorah ]

No último ano, a superfície do Kinneret - ou Mar da Galiléia - baixou dois metros. De 2004 para cá, foram cinco metros de recuo, para a agonia do lago responsável por 40% da água potável consumida em Israel e redondezas. Mantido pelas chuvas e pelos rios do norte, o Kinneret é mais uma vítima do aquecimento global. É do Kinneret que saem as águas que formam o Rio Jordão e desembocam no Mar Morto, não sem antes abastecer milhões de pessoas às suas margens. Estudos recentes mostram que só 10% do fluxo inicial do Jordão - rio de muita história e pouca água, como disse Shimon Peres - chegam ao Mar Morto, que também está secando.

Na Cisjordânia, à margem esquerda do rio, há cidades onde os caminhões-pipa são disputados a tapa enquanto, nas feiras livres, se vendem apenas vegetais de clima desértico como berinjelas e feijões. "Nossas torneiras estão secas", reclamam os moradores de Jenin. Do lado israelense a situação também é delicada. O governo ameaça aumentar o preço da água e fiscais estão multando quem rega os jardins durante o dia. Nos jornais, uma campanha informa que cada minuto de banho consome dez litro d'água, ou seja, uma enormidade. Escovar os dentes com a torneira fechada e só lavar os carros com parcimônia são recomendações básicas. Mas, segundo os ambientalistas da ONG Amigos da Terra Oriente Médio, a campanha está errando o alvo. O vilão da história não seria o consumo doméstico.

"Não podemos desperdiçar nossa água com bananas e melancias", alerta Gideon Bromberg, diretor da sede israelense da ONG, propondo que Israel centre sua economia na tecnologia e em serviços não poluentes, ao invés de desafiar o clima.

Faz sentido, a julgar pelo dado apresentado pela ONG: hoje, embora consuma metade da água disponível no país, a agricultura só representa 2% do PIB israelense. O mundo mudou, a globalização é fato e aquelas lendárias plantações no meio do deserto, orgulho de todos nós, parecem mais românticas do que propriamente viáveis, principalmente quando se sabe que a água usada ali é subsidiada pelo governo.

A busca de alternativas é questão de primeira ordem. Em 2005 foi inaugurada uma grande usina de dessanilização da água do mar, na cidade costeira de Ashkelon. Israel domina a tecnologia e já constrói sua terceira usina enquanto implanta projetos parecidos na Ásia e nos Estados Unidos. O maior problema dessa técnica é o custo e a manutenção. Apesar de ser a maior do mundo, a usina de Ashkelon só produz 13% do consumo necessário para o uso doméstico e urbano em Israel, cuja população não pára de crescer tanto numérica quanto economicamente. Em suma, o bom e velho Kinneret ainda é fundamental não só para matar a sede como para manter a paz com os vizinhos.

Por sinal, a seca é uma questão basilar da cultura judaica. O sentido agrícola de festas como Pessach ou Shavuot é muito enaltecido em Israel, onde os ciclos da natureza ainda ditam a sobrevivência de muita gente. Existe, inclusive, um dia especial chamado Shemini Atzeret, no fim de Sucot, quando se roga a Deus que faça chover no ano que está começando.

É nessas horas que os opostos se atraem: os mais pragmáticos acendem uma vela e os religiosos respeitam a tecnologia. Se há uma coisa em comum entre os gregos e troianos de Israel é a esperança de que os céus sejam mais generosos e que o velho Jordão volte a ter tanta água quanto história.

1.3.09

“Valsa com Bashir” – reflexões em torno da guerra do Líbano



O filme israelense Valsa com Bashir, desenho animado para adultos, até parecia favorito mas não levou o Oscar de “melhor filme estrangeiro”, semana passada. Porém prêmios anteriores e a aclamação de público e crítica, em Israel e na Europa, já haviam transformado o diretor Ari Folman em celebridade antes de sua chegada a Hollywood.

O filme (veja trailer ao lado) gira em torno de um momento trágico, o assassinato de palestinos por falangistas libaneses, em 1982, nos campos de refugiados de Sabra e Shatila controlados pelo Exército israelense, e de suas repercussões, gerais e psicológicas. É com a visão de quem esteve perto do local dos massacres que Folman relata o trauma e o apagamento da memória de um jovem soldado. Folman descobriu que também havia esquecido a maioria dos fatos presenciados naquela época, e entrevistou antigos companheiros para compor seu painel.

A película teve financiamento oficial e contou com a ampla promoção da diplomacia israelense nos EUA – que não reza pela cartilha de tratar seu país como mito e assistiu em peso à cerimônia do Oscar. Folman deu duas razões para a reação positiva do governo ao seu filme. Uma: ele apresenta Israel como um país tolerante, que permite que seus soldados falem abertamente a respeito de suas vivências de guerra. Outra: mostra que não foram as tropas israelenses que cometeram os massacres de Sabra e Shatila.

Como o filme não é propaganda, vale muito mais do que se propaganda fosse. Segundo um diplomata israelense em Nova York, David Saranga, a história serve para, entre outras coisas, mostrar ao mundo, que vê Israel como um Estado militar, a profunda moralidade das Forças Armadas do país e dos israelenses em geral.

Alguns teriam preferido que algum filme leve (estilo comédia à beira-mar em Tel Aviv) tivesse sido escolhido para representar Israel na festa do Oscar. Mas já que a opção foi por “Valsa com Bashir”, o pragmatismo norte-americano (leia-se Fundação para a Cultura Judaica / Foundation for Jewish Culture) produziu um guia didático para quem for assistir “Valsa com Bashir” entender melhor o contexto em que o drama se desenrola.

O guia baseia-se principalmente na investigação que os próprios israelenses fizeram sobre Sabra e Shatila e apresenta os fatos anteriores e posteriores à guerra do Líbano. Minha conclusão: para defender uma causa a longo prazo, é melhor não tratar o distinto público como se este fosse um grupo de escolares ignorantes...

O poder da propaganda nazista




A primeira imagem é de um cartaz do filme O Judeu Errante, de 1940.
O segundo poster informa: "Ele é o culpado pela guerra" (1932).
E o terceiro: "Por trás do poder inimigo, o judeu" (1942).


Reconhecer o risco do antissemitismo faz parte de qualquer agenda judaica. Mas um mínimo de bom senso recomenda desconfiar dos exageros que beiram o absurdo – como os e-mails que garantem que a França está se tornando um país inóspito para os judeus, ou que a Europa está às vésperas de ser dominada por bandos de nazistas enlouquecidos.

Como disse Freud, às vezes um charuto é apenas um charuto; e um incidente pode ser apenas um incidente. Entender isso não significa desprezar a maré montante dos chavões que até pouco tempo atrás eram típicos da direita e do nazi-fascismo e hoje são proclamados por certos setores da esquerda. À falta de outras utopias no horizonte, tais setores afirmam com insistência a “boa nova” de que há, no glorioso porvir dos povos árabes, uma iminente revolução libertadora posta em perigo pelos....judeus. Claro, quem senão os judeus para atrapalhar a vida dos outros?

Tudo isso a propósito da didática exposição que está no Museu do Holocausto, em Washington, intitulada: “State of Deception: The Power of Nazi Propaganda” [Estado de embuste: o poder da propaganda nazista]. As caricaturas foram poderosas armas de convencimento de milhões de pessoas assombradas pela crise econômica pós-1929. Funcionaram. Se os judeus eram mesmo tão pérfidos como a propaganda nazista os mostrava, então qualquer pacato cidadão alemão ainda não convencido rapidamente poderia admitir a justeza das políticas "necessárias" para que enfim chegassem os novos tempos anunciados pelo Terceiro Reich.

O poster que culpa os judeus pela guerra, por exemplo, é de 1932, quando os nazistas estavam em ascensão e eram o segundo maior partido no parlamento alemão.

Em artigo sobre a exposição no New York Times, Edward Rothstein diz que a propaganda nazista não apenas distorceu a realidade para costurar cuidadosamente um argumento comprovando a vilania judaica; ela recriou a realidade, aproveitando antigas crenças míticas sobre o caráter não humano e assassino dos judeus e incitando, portanto, à aceitação de qualquer ato violento contra eles. Acho que nada de sequer longinquamente comparável acontece hoje, mas não custa ficarmos atentos às variadas xenofobias (e não só contra nós) que aparecem por aí.

De Villa-Lobos para Israel



Um facsímile de Odisséia de uma Raça (Poema Sinfônico), de Heitor Villa-Lobos, composto em 1953, por ocasião do quinto aniversário do Estado de Israel, faz parte agora do acervo do Museu Judaico (doação de Adolfo Berditchevsky). A obra foi apresentada em primeira audição mundial em Haifa, pela Filarmônica de Israel, sob a regência de Michael Taube, em 1954. Quem sabe alguém se anima a repetir a dose, aqui, neste ano de tantas homenagens ao compositor pelo cinquentenário de sua morte?

No final da partitura, o compositor adicionou três linhas ao povo judeu (ele falou em raça, equívoco comum na época....): “Na formação do Universo, Deus criou uma raça heróica que viveu e sofreu, mas venceu em Israel”.

O consultor musical do Museu Villa-Lobos, Marcelo Rodolfo, acredita que o original da partitura tenha sido doado ao Estado de Israel. Ninguém sabe onde foi parar. O Museu, em Botafogo, está digitalizando as obras do compositor e merece uma visita. Ao vivo ou no site http://www.museuvillalobos.org.br/