21.9.09

Cinema e política





É possível falar do filme israelense “Lebanon”, ganhador do Leão de Ouro (melhor filme) do Festival de Veneza mesmo antes de vê-lo. Pelo tema e pelas intenções do diretor Samuel Maoz, um dos aspectos que ele coloca em pauta é o vínculo entre arte e política, especialmente intenso em situações extremas e em zonas de guerra.

Maoz, 47 anos, participou da guerra do Líbano em 1982, e contou nunca ter superado o trauma. Afirmou que talvez não tivesse sido premiado (esse foi seu primeiro longa-metragem) se a atriz Jane Fonda estivesse no júri. “O objetivo de um filme como o meu é abrir o diálogo, fazer as pessoas falarem de assuntos importantes”, disse ele ao jornal britânico The Observer. “E isso é algo que não se pode fazer se os filmes forem boicotados. Não faz sentido boicotar a arte”.

Jane Fonda foi uma das signatárias da carta sugerindo o boicote ao Festival Internacional do Filme de Toronto poque este homenageou o centenário de Tel Aviv com uma série de películas sobre a cidade. Agora, duas semanas depois de assinar a carta, ela quase voltou atrás: escreveu uma coluna (no Huffington Post) dizendo que não lera  com cuidado o documento e que algumas palavras “desnecessariamente inflamatórias” contra a homenagem a Tel Aviv não haviam saído do fundo do seu coração...

Para manter a polêmica, artistas judeus conhecidos, entre eles Jerry Seinfeld, Sacha Baron Cohen e Natalie Portman, publicaram um anúncio nos jornais Los Angeles Times e Toronto Star, afirmando: “Quem quer que tenha assistido ao cinema israelense recente, com filmes que podem ser políticos e pessoais, cômicos e trágicos, frequentemente críticos, sabe que eles não são, de maneira nenhuma, um braço de propaganda da política do governo.”

O filme de Maoz – que teve financiamentos públicos e privados israelenses – transcorre sob a perspectiva de quatro soldados enclausurados num tanque, de onde miram alvos militares e civis. A primeira missão deles é entrar numa aldeia libanesa para atacar terroristas palestinos, com todos os ônus letais que isso implica para a população civil. Tema de alta voltagem e incômodo, tanto que esse é o terceiro filme israelense recente a focalizar a invasão do Líbano, depois de Beaufort (2007) e de Valsa com Bashir (2008).

O fato de o cineasta ter alegado que “Lebanon” não é um filme político, mas um depoimento exclusivamente pessoal sobre a tragédia da guerra, indica como a palavra “política” esvaziou-se, pois a rejeição dele aos clichês heróicos é uma opção política na acepção ampla do termo (opção, aliás, só viável nas democracias).

Pena que, do outro lado, intelectuais e artistas árabes vivam em eterno silêncio quando se trata de autocríticas ou da manifestação pública de dilemas morais...